Aqui vão algumas das ideias que ficaram das declarações proferidas
pelo Prof. João Sentieiro, no dia 15 de Junho, em Vairão, durante a
apresentação do Consórcio InBio. Estas afirmações serviram de resposta a várias perguntas da audência presente sobre a situação dos bolseiros em Portugal. Algumas poderão estar fora do contexto mas não deixam de ser graves para a posição que ele tem na Ciência...
MUITA ATENÇÃO, apesar de se tentar reproduzir o melhor possível
o que foi dito, as frases que aqui estão não transcrevem ipsis verbis as
declarações proferidas pelo Prof. João Sentieiro.
De qualquer forma, em relação à primeira frase, que afirma que os bolseiros são uns privilegiados, foi a
mais marcante, sem dúvida aquela de que todos se lembram na perfeição, e sobre a qual não há dúvidas relativamente ao modo como foi proferida e que
mais fez aumentar o descontentamento entre a assistência de bolseiros.
Os bolseiros são privilegiados pois fazem aquilo de que gostam e ainda são
pagos para isso.
A nova proposta do estatuto de bolseiro da ABIC quer transformar os
bolseiros em funcionários públicos.
Se um bolseiro é considerado um trabalhador igual aos outros então um
estudante de engenharia também devia ser pago para estudar engenharia.
Concordo que as pessoas tenham bolsas de pós-doc de 3 anos a seguir ao
doutoramento, mas não devem ter bolsas para toda a vida.
Têm que se mentalizar que têm que ir lá para fora e que isso não é mau para
o país.
Concordo com o aumento dos montantes das bolsas, mas isso irá fazer com que
menos pessoas recebam bolsas no futuro.
Quando questionado sobre o que pensava das recomendações da UE para que os
bolseiros fossem tratados como trabalhadores, afirmou que não queria saber
do que a UE dizia.
Declarações do Presidente da FCT Prof. João Sentieiro
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Pois...
O que dizer perante isto?
Eu pessoalmente desanimo... Sem dúvida que sim. Por outro lado fico revoltado, pois claro que sim. O que vale é que destas forças de sinal contrário, a que acaba por ganhar é a força da revolta.
De qualquer forma, para que possamos discutir com rigor, seria importante que algum dos presentes no dia 15 de Junho, em Vairão, durante a apresentação do "Consórcio InBio" conseguisse aceder às declarações (que de certeza estarão gravadas em áudio e/ou vídeo) e as transcrevesse na íntegra aqui.
Ainda assim, aqui ficam uns comentários breves.
Infelizmente estas declarações já não conseguem ser surpreendentes. Nada de novo, portanto. Talvez o sarcasmo destas declarações seja mais requintado. De resto, o presidente da FCT - João Sentieiro - continua a fazer questão de falar sem pensar e, pior, contínua a fazer questão de manter as pessoas mal informadas. Isto é, na melhor das hipóteses, desinformação, na pior, terrorismo intelectual. E, claro, é tanto mais grave quanto maiores as responsabilidades de quem profere tais afirmações.
Ora vejamos. A ABIC não defende em nenhum momento da PAEBI (Proposta de Alteração ao Estatuto dos Bolseiro de Investigação) a transformação dos "bolseiros em funcionários públicos". Posso afirmar isto enquanto membro da direcção da ABIC mas, sobretudo, porque tive o privilégio de integrar o grupo de trabalho que redigiu a PAEBI. É neste sentido que sei exactamente o que lá está e em nenhum momento se defende o enunciado pelo presidente da FCT. Afirmá-lo revela uma de duas coisas, ignorância, se quisermos ser benevolentes, ou, intencionalidade em manipular a discussão em torno do EBI, descredibilizando a ABIC e as suas propostas com vista a enfraquecer a sua posição negocial, se quisermos ser mais rigorosos.
Não somos ingénuos (pelo menos demasiado) e estamos bem conscientes que a utilização do argumento que a ABIC pretende transformar os "bolseiros em funcionários públicos" pretende, antes de mais, tornar a ABIC indistinta das forças sociais que contestam o governo por motivos laborais. Esta posição pretende enfraquecer a reivindicação da ABIC na medida que a dilui no seio das reivindicações de outras forças sociais. Mas não é disto que trata a PAEBI. Pretendemos, antes de mais, a implementação da recomendação da UE relativa à Carta Europeia do Investigador. Não somos nós que, de forma isolada, consideramos que os investigadores devem ser considerados trabalhadores. Sustentamos esta nossa argumentação numa recomendação de uma instituição de reconhecido mérito, a Comissão Europeia, que na Carta Europeia do Investigador recomenda que os investigadores, mesmo em início de carreira (incluindo doutorandos), sejam encarados e tratados como trabalhadores. Mais, a ABIC reclama contratos de trabalho no lugar de contratos de bolsas essencialmente para que os bolseiros possam ter acesso às regalias sociais a que têm acesso todos os trabalhadores. Em nenhum momento se defende, nas várias propostas que a ABIC tem elaborado, a integração dos funcionários em qualquer tipo de Função Pública. Os contratos de que falamos são contratos a termo certo, exactamente como as bolsas (por exemplo, no lugar de uma bolsa de 3 anos, um investigador teria um contrato de 3 anos). Isto permitiria, por exemplo, o acesso ao Regime Geral da Segurança Social (com as mesmas coberturas e eventualidades que têm todos os trabalhadores, os por conta própria e os por conta de outrém) no lugar do Seguro Social Voluntário, manifestamente insuficiente relativamente às eventualidades que contempla. Em que momento é que se fala em "transformar os bolseiros em funcionários públicos"? Falamos em estabelecer contratos, que podem ser com instituições públicas ou privadas (até nem especificamos se os contratos deverão ser celebrados com a instituição financiadora ou com a instituição de acolhimento), mas que são sempre contratos a termo-certo, sem qualquer obrigatoriedade de renovação ou transição para qualquer carreira. Defender direitos não é defender qualquer funcionalização dos bolseiros.
Uma qualquer pessoa deve ser considerada trabalhadora se produz trabalho. Ou, quem produz trabalho deve ser considerado trabalhador. Parece óbvio...? Um estudante de engenharia (ou de qualquer outra disciplina, já agora...) não tem como objectivo do seu plano de estudo a produção de trabalho científico com publicação de artigos em revistas científicas com revisão por pares, ou tem? Se tiver, então o que ele faz é produzir trabalho científico... Pois bem, um bolseiro tem como objectivo último, a publicação do trabalho desenvolvido. A isto chamamos trabalho científico... Poderá chamar-se outra coisa? Em que medida é que isto - a publicação de investigação em revistas científicas com revisão por pares; a apresentação de comunicações e posters em congressos; etc. - é diferente do trabalho científico produzido por qualquer investigador sénior? Mais, em que medida é que a natureza do trabalho de um doutorando se distingue do trabalho de um investigador sénior, para além do facto de o primeiro ter que escrever e defender uma tese e o último ter, normalmente, maiores responsabilidades de coordenação e gestão de ciência? Não partilham todos dos mesmos objectivos, produzir ciência de qualidade, publicando nas mais conceituadas revistas das respectivas áreas?
Termino com a tristeza de ver alguém com as responsabilidades do João Sentieiro afirmar, desenvergonhadamente, que não quer saber do que a UE diz ou recomenda...
Esperávamos mais, muito mais!
Abraços e beijinhos,
rui
O que dizer perante isto?
Eu pessoalmente desanimo... Sem dúvida que sim. Por outro lado fico revoltado, pois claro que sim. O que vale é que destas forças de sinal contrário, a que acaba por ganhar é a força da revolta.
De qualquer forma, para que possamos discutir com rigor, seria importante que algum dos presentes no dia 15 de Junho, em Vairão, durante a apresentação do "Consórcio InBio" conseguisse aceder às declarações (que de certeza estarão gravadas em áudio e/ou vídeo) e as transcrevesse na íntegra aqui.
Ainda assim, aqui ficam uns comentários breves.
Infelizmente estas declarações já não conseguem ser surpreendentes. Nada de novo, portanto. Talvez o sarcasmo destas declarações seja mais requintado. De resto, o presidente da FCT - João Sentieiro - continua a fazer questão de falar sem pensar e, pior, contínua a fazer questão de manter as pessoas mal informadas. Isto é, na melhor das hipóteses, desinformação, na pior, terrorismo intelectual. E, claro, é tanto mais grave quanto maiores as responsabilidades de quem profere tais afirmações.
Ora vejamos. A ABIC não defende em nenhum momento da PAEBI (Proposta de Alteração ao Estatuto dos Bolseiro de Investigação) a transformação dos "bolseiros em funcionários públicos". Posso afirmar isto enquanto membro da direcção da ABIC mas, sobretudo, porque tive o privilégio de integrar o grupo de trabalho que redigiu a PAEBI. É neste sentido que sei exactamente o que lá está e em nenhum momento se defende o enunciado pelo presidente da FCT. Afirmá-lo revela uma de duas coisas, ignorância, se quisermos ser benevolentes, ou, intencionalidade em manipular a discussão em torno do EBI, descredibilizando a ABIC e as suas propostas com vista a enfraquecer a sua posição negocial, se quisermos ser mais rigorosos.
Não somos ingénuos (pelo menos demasiado) e estamos bem conscientes que a utilização do argumento que a ABIC pretende transformar os "bolseiros em funcionários públicos" pretende, antes de mais, tornar a ABIC indistinta das forças sociais que contestam o governo por motivos laborais. Esta posição pretende enfraquecer a reivindicação da ABIC na medida que a dilui no seio das reivindicações de outras forças sociais. Mas não é disto que trata a PAEBI. Pretendemos, antes de mais, a implementação da recomendação da UE relativa à Carta Europeia do Investigador. Não somos nós que, de forma isolada, consideramos que os investigadores devem ser considerados trabalhadores. Sustentamos esta nossa argumentação numa recomendação de uma instituição de reconhecido mérito, a Comissão Europeia, que na Carta Europeia do Investigador recomenda que os investigadores, mesmo em início de carreira (incluindo doutorandos), sejam encarados e tratados como trabalhadores. Mais, a ABIC reclama contratos de trabalho no lugar de contratos de bolsas essencialmente para que os bolseiros possam ter acesso às regalias sociais a que têm acesso todos os trabalhadores. Em nenhum momento se defende, nas várias propostas que a ABIC tem elaborado, a integração dos funcionários em qualquer tipo de Função Pública. Os contratos de que falamos são contratos a termo certo, exactamente como as bolsas (por exemplo, no lugar de uma bolsa de 3 anos, um investigador teria um contrato de 3 anos). Isto permitiria, por exemplo, o acesso ao Regime Geral da Segurança Social (com as mesmas coberturas e eventualidades que têm todos os trabalhadores, os por conta própria e os por conta de outrém) no lugar do Seguro Social Voluntário, manifestamente insuficiente relativamente às eventualidades que contempla. Em que momento é que se fala em "transformar os bolseiros em funcionários públicos"? Falamos em estabelecer contratos, que podem ser com instituições públicas ou privadas (até nem especificamos se os contratos deverão ser celebrados com a instituição financiadora ou com a instituição de acolhimento), mas que são sempre contratos a termo-certo, sem qualquer obrigatoriedade de renovação ou transição para qualquer carreira. Defender direitos não é defender qualquer funcionalização dos bolseiros.
Uma qualquer pessoa deve ser considerada trabalhadora se produz trabalho. Ou, quem produz trabalho deve ser considerado trabalhador. Parece óbvio...? Um estudante de engenharia (ou de qualquer outra disciplina, já agora...) não tem como objectivo do seu plano de estudo a produção de trabalho científico com publicação de artigos em revistas científicas com revisão por pares, ou tem? Se tiver, então o que ele faz é produzir trabalho científico... Pois bem, um bolseiro tem como objectivo último, a publicação do trabalho desenvolvido. A isto chamamos trabalho científico... Poderá chamar-se outra coisa? Em que medida é que isto - a publicação de investigação em revistas científicas com revisão por pares; a apresentação de comunicações e posters em congressos; etc. - é diferente do trabalho científico produzido por qualquer investigador sénior? Mais, em que medida é que a natureza do trabalho de um doutorando se distingue do trabalho de um investigador sénior, para além do facto de o primeiro ter que escrever e defender uma tese e o último ter, normalmente, maiores responsabilidades de coordenação e gestão de ciência? Não partilham todos dos mesmos objectivos, produzir ciência de qualidade, publicando nas mais conceituadas revistas das respectivas áreas?
Termino com a tristeza de ver alguém com as responsabilidades do João Sentieiro afirmar, desenvergonhadamente, que não quer saber do que a UE diz ou recomenda...
Esperávamos mais, muito mais!
Abraços e beijinhos,
rui
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Tanto quanto sei, não é a primeira vez que o presidente da FCT declara não querer saber, ou pelo menos não se sentir obrigado a ter em conta, as recomendações da Comissão Europeia a propósito da Carta Europeia dos Investigadores. Tendo em conta a gravidade destas afirmações, acho que nenhum bolseiro deve deixar passar em branco este tipo de declarações, confrontando o presidente da FCT sempre que possível. Há que documentar as afirmações que têm sido feitas (exigir uma posição por escrito da parte do presidente da FCT seria também aconselhável) e dar conhecimento às instituições relevantes (desde já me ocorre a própria Comissão Europeia, a Assembleia da República e os seus grupos parlamentares, a Presidência da República e a Provedoria). Não acredito que esta luta se ganhe de forma institucional. No entanto penso que se devem explorar todas as vias possíveis (quando mais não seja para não virmos a ser acusados de não o fazer!).
Nuno Castro
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