Comunidade Científica Preocupada com a Falta de Emprego

Emprego científico ou emprego para cientistas? Porquê? Para quê? Que futuro?
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Comunidade Científica Preocupada com a Falta de Emprego

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Comunidade Científica Preocupada com a Falta de Emprego
Por JOANA FILIPE
Quinta-feira, 20 de Maio de 2004


Durante os anos 90, Portugal foi protagonista de um enorme crescimento do número de doutorados na ciência, mas a escassez de emprego científico, nas carreiras de docência e investigação, e a falta de interesse das empresas nacionais, atirou uma nova geração de recursos humanos altamente qualificados para um trajecto de bolsas consecutivas. Um caminho instável e precário que os transformou numa espécie de "proletários intelectuais". Ontem, em Lisboa, numa conferência da Associação de Bolseiros de Investigação Científica, traçou-se um quadro negro do emprego científico em Portugal, embora com a esperança de soluções.

A dificuldade em arranjar emprego não ajuda a tornar a carreira científica atraente para os jovens estudantes, disse Margarida Fontes, do Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial. O que põe em causa os objectivos da Estratégia de Lisboa, que prevê que os países da União Europeia dediquem, em média, três do por cento do PIB à investigação, em 2010.

A ministra da Ciência e do Ensino Superior, Maria da Graça Carvalho, esteve na abertura do encontro, e garantiu para 2006 a superação da "barreira psicológica" do um por cento do PIB português - o que significaria a integração de mais 5000 cientistas no mercado de trabalho.

Mas, por enquanto, a alternativa para os novos doutorados é, muitas vezes, a emigração, desaproveitando-se assim o investimento público feito na sua formação. Outros vão saltando de bolsa em bolsa.

Como novidade, a ministra levou o anúncio de que será revisto o estatuto do bolseiro. Estes investigadores passam assim a ter cobertura financeira em casos de suspensão da actividade por doença ou maternidade, direito a férias e a cuidados de saúde. O novo estatuto, actualmente em sede de Comissão Parlamentar, prevê ainda o alargamento do regime de dedicação exclusiva, permitindo que "os bolseiros se dediquem a outras actividades, nomeadamente de docência", desde que relacionadas com o seu projecto de investigação.

A revisão do estatuto não integra, no entanto, duas reivindicações destes investigadores: o direito a subsídio de desemprego e a contagem de tempo de serviço para efeitos de reforma e concurso públicos. Maria da Graça Carvalho entende que o "espírito de bolseiro" não deve ser substituído pelo de um trabalhador por conta de outrem. "Existem bolseiros há muito tempo, mas não é mudando o estatuto que se muda isso, é criando em paralelo condições de emprego científico", disse.
Contratos de trabalho escasseiam

Mas os contratos de trabalho para doutorados escasseiam no panorama nacional. As admissões de investigadores em laboratórios do Estado estão congeladas desde 2000 e os laboratórios associados que, devido ao seu estatuto de excelência, poderiam contratar doutorados num regime de co-financiamento público, têm-se debatido com o incumprimento dos contratos estabelecidos com o Estado. O descongelamento das verbas comunitárias, assegura a ministra, irá pôr fim a este problema. Em breve deverão ser criados mais seis laboratórios associados, o que alargará o mercado de vagas de emprego para doutorados.

A carreira universitária também não se tem revelado uma opção fácil, já que o alargamento dos quadros tem sido muito restrito. A comunidade científica queixa-se de um modelo de financiamento que se pauta pela relação entre o número de alunos e o de professores, descuidando a investigação. Por outro lado, a "endogamia universitária", como lhe chamou Manuel Heitor, um dos oradores, tem dificultado a entrada de sangue novo nas universidades, já que a tendência é que a progressão de carreira seja feita numa única instituição durante toda a vida.

Nos princípios da Estratégia de Lisboa, a iniciativa privada deveria suportar dois terços do aumento do PIB em Investigação e Desenvolvimento. No entanto, em Portugal, a presença de doutorados no tecido empresarial é quase inexistente. O programa de inserção de doutorados e mestres em empresas permitiu colocar 75 doutorados em sete anos - um número bastante reduzido para as ambições europeias.

Mas porquê o desinteresse das empresas portuguesas pelos doutorados, numa altura em que as sociedades desenvolvidas apostam cada vez mais na ciência e na tecnologia?

Os currículos universitários poderão ter alguma responsabilidade na desadequação entre a oferta e a procura, mas Margarida Fontes referiu também a "imagem negativa" que muitas empresas têm dos doutorados. São vistos como "muito especializados e pouco flexíveis" e com um conhecimento "demasiado académico". Por isso, alertou, será também necessário "alterar a percepção" das empresas, para além de incentivos governamentais (benefícios fiscais, por exemplo) em troca da contratação de doutorados.

Outro caminho possível para os doutorados é criarem as suas próprias empresas. O programa NEST apoia a criação de novas empresas de alta tecnologia ou de base tecnológica, assegurando o financiamento para o pagamento dos ordenados dos doutorados. A medida pretende, segundo a ministra, "fomentar o empreendedorismo".

Para que, no futuro, haja mais investigadores a trabalhar em Portugal e as metas europeias sejam cumpridas, "será necessário investir mais em escala e em intensidade na ciência", resumiu Manuel Heitor. Ou seja, apostar na criação de emprego científico, e assim atrair mais estudantes para uma carreira até agora instável.

in: Público http://jornal.publico.pt/2004/05/20/Ciencias/H01.html

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Quinta-feira, 20 de Maio de 2004

3,5 era o número de investigadores portugueses por cada mil habitantes da população activa em 2001

5,7 era a média europeia de investigadores por cada milhar de habitantes no mesmo ano

8,1 era o número de investigadores da população activa dos Estados Unidos em cada mil habitantes

Fonte: Jornal Público

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